A pandemia da covid-19 bagunçou o ritmo da sazonalidade das doenças pediátricas. E no Distrito Federal não é diferente. As emergências estão superlotadas. Isso porque o Vírus Sincicial Respiratório (VSR), que antes costumava circular mais entre outono e inverno, está se manifestando com antecedência. Os sintomas são semelhantes a uma gripe e predominam entre crianças de zero a quatro anos de idade. A antecipação da doença exige preparo nos hospitais, com mais pediatras, medicamentos e estrutura. Ao mesmo tempo, pede mais cuidado e atenção dos pais, já que o VSR é responsável por 75% das bronquiolites e 40% das pneumonias em crianças menores de dois anos.
A mudança no comportamento do Vírus Sincicial Respiratório começou a ser observada em 2021, nos EUA, em um hospital infantil de Nova York. Enquanto os casos de covid-19 estavam em queda, infecções virais entre crianças começavam a aumentar. Em março daquele ano, um número crescente de crianças e bebês começou a chegar ao hospital com dificuldade para respirar. Estudos apontam que a mudança no comportamento da doença é uma consequência indireta da pandemia. O isolamento social impediu sua circulação. O resultado é que as crianças não tiveram a oportunidade de criar imunidade contra ela.
Em todo o país, segundo dados do Ministério da Saúde, os últimos dois meses de 2022 registraram 1.406 casos de VSR em crianças de zero a quatro anos, o que representa uma alta de 22% em comparação com os dois meses anteriores, quando foram registrados 1.155 casos. Importante: em bebês com menos de seis meses, principalmente prematuros, o risco do Vírus Sincicial Respiratório é maior e até 15% dos casos requerem internações.
A alta de infecções era esperada apenas em fevereiro, na região Norte, em março no Centro-oeste, Nordeste e Sudeste, e em abril, no Sul. O que, para a rede pública de saúde, já escassa, é preocupante. No Distrito Federal, por exemplo, houve alta de 450% nos casos. Os hospitais do DF estão sobrecarregados. Segundo denúncia feita ao Sindicato dos Médicos do DF, há déficit de profissionais para atender a demanda em diversas unidades de Saúde, entre médicos, enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem.
Nos hospitais particulares, as emergências também começam a lotar. A situação exige uma resposta rápida da gestão da Saúde. Além disso, é preciso redimensionar o número de profissionais em ambas as redes: pública e suplementar.
Do dia 11 de dezembro do ano passado até 7 de janeiro, de acordo com levantamento da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o VSR correspondeu a 59% dos casos de Síndrome Respiratório Aguda Grave (SRAG), com resultado laboratorial positivo em crianças de 0 a 4 anos de idade. É importante destacar que não existe vacina contra o Vírus Sincicial Respiratório. Por isso, a prevenção deve ser prioridade entre pais, responsáveis e até escolas, com foco na limpeza frequente das mãos, tanto água e sabão como com álcool em gel.
Além da prevenção, como médico e presidente do SindMédico-DF, indico ainda que as gestões pública e privada da Saúde do DF elaborem um amplo plano de ação para os próximos meses, a fim de evitar uma piora do cenário, com tumultos em hospitais, mais desassistência nas emergências e mais superlotações. Além disso, é preciso que órgãos que defendem os interesses sociais, como o Ministério do Público do DF e o Conselho Regional de Medicina, estejam atentos à situação para cobrar providências. Afinal de contas, o caos na Saúde do Distrito Federal historicamente é anunciado. E quem mais sofre é a população e os profissionais que estão na ponta do atendimento.