Estou na torcida, vibrando com as conquistas dos atletas brasileiros nos Jogos Olímpicos de Paris. Mas faço aqui uma reflexão sobre o que realmente representa cada medalha conquistada pelos nossos representantes nos jogos olímpicos. São o resultado de uma superação pessoal dos atletas, mas em que nível refletem a evolução do Brasil enquanto nação?
Há fatores culturais, políticos e econômicos que são determinantes para o desempenho de um país em torneios esportivos internacionais como uma olimpíada. Fatores que também condicionam a evolução do indivíduo em uma carreira no esporte e o que vai ser dessa pessoa depois que deixar de ser atleta profissional.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a carreira no esporte tem um aspecto cultural forte em uma economia forte – é um país que valoriza múltiplas modalidades e onde há patrocínio privado farto. Lá, a prática desportiva tem uma ligação muito forte com a educação. A iniciação e a evolução no esporte ocorrem no ambiente escolar e as universidades oferecem bolsas aos atletas de alto desempenho – o que se torna um incentivo ao estudo e a ter uma profissão. E isso define o futuro do indivíduo, após o relativamente curto período de dedicação ao esporte profissional com alto grau de desempenho.
Diferente do que ocorre nos EUA, o mais comum por aqui é os atletas serem oriundos de projetos sociais, salvo não muitas exceções. O esporte no Brasil, no nível de políticas públicas, historicamente é tratado como alternativa para evitar que crianças e jovens caiam na marginalidade.
Mas se os jovens engatam no esporte profissional, dificilmente vão seguir nos estudos. E como eles ficam quando o auge chega ao fim, entre os 30 e os 40 anos, a depender da modalidade? Nossos heróis olímpicos são esquecidos. A ex-pivô da Seleção Brasileira de Basquete, prata na Olimpíada de Atlanta (EUA), Cláudia Pastor, por exemplo, teve que leiloar a medalha que conquistou para pagar um tratamento de saúde para o filho.
Outros tantos, por mais talento que tenham, abortam o sonho de subir ao pódio por falta de condições já na linha de largada. As bolsas pagas – que são de baixo valor nos níveis de base e cujo pagamento é, muitas vezes, irregular – não cobrem os gastos com o necessário para a preparação física, às vezes nem para comprar um bom par de tênis. E, muitas vezes, o atleta ainda tem que ajudar no sustento da família – acaba sendo atleta e motorista de aplicativo (por exemplo) ou desiste.
Nosso herói olímpico, Caio Bonfim, prata na marcha atlética, em Paris, é uma exceção à regra. Treinado pelos próprios pais (João, educador físico, e Gianetti, ex-atleta) é sargento da Força Aérea Brasileira faz parte do Programa Atletas de Alto Rendimento (PAAR), coordenado pelo Ministério da Defesa. Teve suporte no início da carreira no esporte e tem garantias para o futuro.
Os programas estaduais e federal de bolsas têm, evidentemente, um papel importante. Afinal, 241 dos 276 atletas na delegação olímpica brasileira recebem o benefício federal atualmente. E apenas cinco nunca receberam. No entanto, as exigências são grandes para ser um bolsista e os patrocínios muito limitados para a maioria das modalidades – as duas situações condicionadas a vitórias em eventos de destaque.
O Brasil só será uma potência olímpica quando oferecer condições adequadas para que os atletas ingressem no esporte, mantendo uma estrutura de vida adequada, com estudo, saúde, segurança financeira durante e depois do exercício da profissão de atleta. Com as condições que o país oferece aos nossos atletas, eles já são vencedores e heróis mesmo sem subir ao pódio. A conquista de uma medalha, uma glória nacional, não deve ser o condicionante para os atletas brasileiros terem um prato de comida na mesa.