Quando surgiram, em 2003, havia uma mistificação de que os dispositivos eletrônicos para fumar, os cigarros eltrônicos ou vape, não produziam toxicidade e até poderiam ajudar os consumidores de tabaco a parar de fazer uso da versão tradicional – reconhecidamente prejudicial à saúde há muito tempo. Esses argumentos nunca foram comprovados e, entre os mais de 16 mil sabores disponíveis no mercado (ilegal), muitos podem conter até 20 vezes mais nicotina e outras substâncias tão nocivas quanto ela ou até mais ainda. Não há controle sobre o que é colocado na formulação de todos os líquidos consumidos por meio dos vapes.
Um volume cada vez maior de estudos tem mostrado que o vape pode causar danos à saúde na mesma medida ou até mais graves do que o cigarro tradicional. Além da nicotina, os líquidos usados para consumo com cigarros eletrônicos fabricados comercialmente podem contar propilenoglicol ou outros líquidos à base de glicerina vegetal. Estudos indicam que o propilenoglicol, quando aquecido, pode formar substâncias cancerígenas.
E nem todos os líquidos usados em vapes à disposição no mercado são produzidos de forma legal. O acetato de vitamina E, que é encontrado em alguns deles, pode estar envolvido em lesões pulmonares. Tendo ou não nicotina, o vape pode levar ao vício e aos problemas de saúde que ela provoca.
Nos Estados Unidos e no Brasil foram registrados casos de lesão pulmonar que foram relacionados ao consumo de tetrahidrocanabinol e acetato de vitamina E por meio de vapes. Esse quadro recebeu o nome de Evali (sigla para Vaping, product use–Associated Lung Injury). Os sintomas são tosse, dor no peito, falta de ar, dor abdominal, náuseas, vômito, diarreia, febre, calafrios e perda de peso. E pode levar o paciente até a ser entubado, como nos casos de covid-19.
O consumo dos vapores, com nicotina ou outros princípios ativos, predispõe o usuário a problemas cardiovasculares, respiratórios, neurológicos e vários tipos de câncer, além de prejudicar a saúde bucal. Não à toa, a Organização Mundial de Saúde incluiu os dispositivos eletrônicos para fumar, nas suas diversas variantes, no monitoramento da Epidemia Global de Tabaco.
No Brasil, apesar de a comercialização ser proibida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, é cada vez mais comum vermos jovens fazendo uso do dispositivo. A Pesquisa Nacional de Saúde Escolar de 2019, a mais recente disponível, indica que 22,7% dos estudantes de 16 a 17 anos já fizeram uso de cigarro eletrônico. Na faixa dos 13 a 15 anos, essa taxa era de 13,6%. A tendência é que, em uma nova rodada desta pesquisa, nos deparamos com números ainda mais alarmantes.
Os cigarros eletrônicos promoveram uma nova glamourização do hábito de fumar. Além de dar novo impulso ao tabagismo, problema que vem sendo combatido em programas de saúde pública há décadas, ainda criaram novas possibilidades de dano à saúde dos usuários.
Diante de uma proibição que não resolve o problema, resta às autoridades sanitárias promover campanhas de educação e esclarecimento para alertar os jovens e as famílias quanto aos riscos no uso do vape. Também é prudente que as famílias tenham diálogos sinceros e abertos com os jovens sobre a adesão ao que ditam os modismos e sobre a crescente fome de consumo que assola a sociedade ocidental e que, não raro, nos levam a fazer escolhas ruins.