Duas notícias recentes impactam as vidas dos brasileiros no que lhes é mais caro: a saúde. O primeiro é o aumento de 5,6% nos preços dos medicamentos. O segundo é o recado das empresas do ramo da saúde, em evento realizado em Brasília: a Reforma Tributária vai fazer o brasileiro encarar aumento de 15,1% nos preços dos serviços de hospitais e laboratórios privados e 21,6% dos planos de saúde. Em resumo, na saúde a realidade é dura.
De uma forma ou de outra, os efeitos de uma e outra coisa vão desaguar no Sistema Único de Saúde, o nosso SUS. De um lado, porque os pacientes (especialmente os crônicos) tendem a deixar ou reduzir o uso das medicações de uso contínuo. E isso pode provocar agravamento de seus quadros ou agudização de crises. Consequentemente, a busca por atendimentos de emergência e as filas das unidades públicas de saúde crescem.
No caso do eventual aumento nos preços de hospitais, laboratórios e planos de saúde decorrente da Reforma Tributária, segundo a Confederação Nacional de Saúde, levaria 1,15 milhão de usuários de planos de saúde a cancelarem seus planos e migrarem para o atendimento pelo SUS. Mais demanda, mais filas, mais sobrecarga sobre os profissionais, mais dor e sofrimento e mais pressão sobre a economia: trabalhador adoecido produz menos ou deixa de produzir e isso impacta negativamente a economia e pressiona a previdência social.
Dados da Aliança para a Saúde Populacional indicam que 80% das prescrições aviadas por profissionais de saúde não são totalmente compradas, 50% dos pacientes iniciam e param os tratamentos e 30% de toda a população não tem sequer acesso a medicamentos. No caso das doenças crônicas isso é um desastre, segundo aponta a Aliança, pois pacientes crônicos ocupam, em média, 80% das diárias hospitalares, cerca de 70% de todas as internações e 55% dos atendimentos nas emergências.
É fato conhecido de todos a falta constante de medicamentos e insumos que deveriam ser disponibilizados aos pacientes nas unidades básicas de saúde: da fita glicêmica, importantíssima no acompanhamento dos casos de diabetes, à Losartana, medicamento usado no tratamento da hipertensão – e isso só para citar dois exemplos. A lista é bem maior.
Em resumo: a saúde é um tema tradicionalmente maltratado pelo governo. De um lado, a área econômica trata a saúde apenas como custo e não como fator gerador de desenvolvimento. No auge da pandemia da covid-19, por exemplo, o Brasil se deu conta de que somos dependentes de matéria prima e insumos estrangeiros, porque não investimos em pesquisa e desenvolvimento de medicamentos, insumos e equipamentos como ação estratégica. Isso sem contar que permitiram que redes de hospitais, laboratórios e planos de saúde passassem a ser controlados por fundos de investimento predatórios de especuladores estrangeiros – a nossa doença é o lucro deles.
Nesse sentido, foi uma boa notícia a recriação do Grupo Executivo do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, pelo governo federal, para fazer a articulação governamental e formular medidas a ações para fortalecer a produção e a inovação para prover o SUS dos meios para um melhor atendimento à população. Que esse decreto não seja meramente panfletário!
Por sua vez, sem dar a devida atenção à importância da saúde da população para a economia, a área da Saúde trata a assistência à população como programa social – por exemplo, impõe um plano de interiorização da medicina (o Mais Médicos) sem criar postos de emprego médico atrativos nas regiões necessitadas.
Sem saúde, a roda da economia gira mal. Sem garantir o acesso da população à assistência de qualidade e aos medicamentos necessários, o governo desperdiça dinheiro, onera a previdência social com os afastamentos do trabalhador de sua atividade produtiva por doença e com benefícios por invalidez, torna o SUS eternamente insuficiente e perpetua o ciclo de baixo desenvolvimento social e econômico das camadas mais pobres da população: a imensa maioria das pessoas do nosso país.