Burocracia e falta de pessoal com formação técnica adequada e em quantidade suficiente são fatos trágicos na gestão da saúde pública do Distrito Federal. Nesta quinta-feira, dia 2, por exemplo, a Secretaria de Estado de Saúde do DF estampou em sua página da internet a notícia “hospitais preparam força-tarefa de cirurgias ortopédicas” – isso porque os hospitais vão receber 30 novos perfuradores elétricos.
Os perfuradores ósseos não são muito diferentes das furadeiras de parede que a gente tem em casa. Pedindo pela internet, na AliExpress, chega em até 30 dias por R$ 1.928,02 a unidade. A última aquisição da SES-DF foi em 2011. O Hospital Regional de Ceilândia, onde as cirurgias ortopédicas são a maioria, tinha 14, mas só três estão funcionando.
O maior volume de cirurgias no HRC é por trauma (ortopedia) e é necessário operar, no mínimo, 12 pacientes por dia, ou 250 por mês, para não se acumularem pacientes na fila de espera, internados por período prolongado – consumindo mais recursos da saúde e desenvolvendo sequelas, duas situações indesejadas. Força-tarefa com data de começar e terminar não vai resolver: o fluxo é constante.
Novos perfuradores também não vão resolver: no HRC, os médicos precisam de um aparelho de escopia (exame de imagem, como raio-x em vídeo) novo. O que existe lá está ultrapassado e não tem manutenção adequada. E o tomógrafo do hospital também não ajuda: tem quatro canais. Só para estabelecer comparação, o aparelho instalado no Hospital Regional da Asa Norte, durante a pandemia, tem 128 canais.
Além dos equipamentos, têm faltado peças, como parafusos e placas ,para a realização de cirurgias ortopédicas. E depende ainda de haver anestesistas suficientes, salas de cirurgia e leitos pós-cirúrgicos disponíveis. É claro que ter o equipamento ajuda, mas dizer que os novos perfuradores são solução é querer enganar a população.
Falta competência à gestão para oferecer às direções e equipes dos hospitais todo o conjunto de recursos necessários para dar fluxo à realização de cirurgias tanto eletivas quanto emergências. Isso porque as cirurgias emergenciais também estão sendo represadas: em vez de 48 horas, há pacientes esperando até mais de 30 dias por cirurgias de emergência.
Até na gestão de pessoas a ineficiência da SES-DF deixa sequelas. Se o servidor administrativo da área de Recursos Humanos tira férias ou adoece, não há quem tome seu lugar e os processos param. Está acontecendo isso, por exemplo, na análise dos pedidos de aposentadoria, que demoram como em nenhum outro órgão do GDF.
Em todas as áreas os processos param, atrasam ou se perdem num mar de burocracia e troca de ofícios – porque o “sistema informatizado” da SES não automatizou processos, só substituiu o papel pelo formulário eletrônico.
Tem solução? Claro que tem! É qualificar a força de trabalho, contratar gente qualificada para as funções em que faltam, modernizar o conceito do uso da tecnologia para agilizar os processos de trabalho, de gestão e de tomada de decisão. É desrespeito e descaso com os usuários do SUS dizer, por exemplo, que novas furadeiras vão resolver o fluxo de cirurgias ortopédicas. É, no mínimo, uma tremenda falta de imaginação.