Esta semana ganhou espaço na imprensa nacional o caso do jovem Arthur Skyler Santana, rapaz autista que foi barrado em uma estação de metrô do Plano Piloto, onde não queriam permitir sua entrada com o cão auxiliar que o ajuda a se deslocar em segurança e em outras atividades. Mesmo apresentando toda a documentação e até a lei que lhe permite o acesso com o companheiro canino, o garoto ficou 20 minutos retido até que lhe permitissem o embarque.
A condição de Arthur lhe impõe limitações, como por exemplo, subir e descer escadas. A própria forma de atuar dos funcionários do metrô poderia ter desencadeado uma crise, desorientação ou sofrimento emocional desnecessário. Quem estava ali por ele era só o Atlas, seu cão auxiliar.
Seja por questões físicas, fisiológicas, anatômicas ou psíquicas, nem todas as pessoas conseguem, em todas as fases da vida, executar com o máximo de eficiência as atividades que um ser humano no auge de sua capacidade desempenha com facilidade. Pelo menos por questão de envelhecimento, em algum momento todos tendem a desenvolver alguma dificuldade para lidar com a vida quotidiana e estruturas que são pensadas para o ser humano no pleno uso de todas as suas potencialidades.
Desde a década de 1970, vem ganhando força uma visão de que a deficiência não é um problema de indivíduos ou exclusivo da área da saúde, mas da estrutura social. Percebeu-se que são necessárias políticas públicas para que cada um, no limite de sua capacidade, tenha acesso a uma vida dentro dos limites da normalidade, realizando seu potencial de contribuir com a sociedade – saindo do papel de tutelado, dependente ou segregado.
O cão Atlas, auxiliar do jovem Arthur, é o reflexo de uma política pública que permite a ele desenvolver uma atividade normal. Em larga escala, o conjunto das políticas públicas de mobilidade e acessibilidade tem que ser elaborado para permitir às pessoas participar da vida da sociedade – o que tem reflexos no desenvolvimento das cidades e nações, inclusive no seu potencial produtivo. Excluir as pessoas com deficiência, seja ela qual for a limitação, tem o efeito contrário, de retrocesso. Não se trata de estabelecer privilégios.
Os parlamentos, governos e a Justiça têm por obrigação atuar para propor e executar políticas públicas que permitam a todos alcançar seu pleno potencial. Isso se aplica, inclusive, ao transporte público e à pavimentação pública, além de outros. Mas cada um de nós tem contribuições a dar – como, por exemplo, garantir que, na construção de uma rampa para acesso à garagem de casa, não fiquem obstáculos a pessoas que tenham limitações de movimentos ou deficiência visual.
Deficiências não são necessariamente perceptíveis ao primeiro olhar. E nenhum de nós está isento de desenvolver alguma, ainda que temporária – tente, por exemplo, subir uma escada no meio de uma crise renal para entender o drama. Eu aviso: mesmo que você dê conta, dói.
Mas espero que não seja necessário que cada um de nós passe por uma situação assim, para passarmos a nos importar. E espero que nossos governantes e representantes legislativos se tornem cada vez mais sensíveis a essas questões. Que passem a exercer seus mandatos e funções para construirmos uma cidade, um país e uma sociedade que permita a todos realizar o seu potencial humano. O Arthur Santana e outras pessoas com deficiência não precisam de piedade, eles simplesmente merecem e têm direito ao respeito que deve ser dispensado a qualquer cidadão.