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A filantropia é fundamental, mas não substitui a atuação do Estado

Para muitos pensadores a experiência humana, e não exatamente a contagem dos dias, é que constrói o tempo. O historiador britânico Eric Hobsbawm, por exemplo, já afirmou que o século 19 só terminou de verdade depois da Primeira Guerra Mundial, em 1918. Embora o próprio Hobsbawm tenha considerado a derrocada do socialismo soviético,em 1991 como o fim do século 20, não poucos afirmam que só está terminando agora, com a pandemia da covid-19 e a aceleração nas mudanças no tecido social que ela promove.

Antes mesmo que fôssemos tragados pelo tsunami da pandemia, já se anunciava um período de reavaliações e de mudanças que foram aceleradas pela crise sanitária de nível global. Podemos citar como exemplo, a disseminação do trabalho remoto, da educação a distância, da discussão sobre sustentabilidade, consumo e concentração de riquezas.

No início da pandemia, se dizia que a doença não diferenciava ricos e pobres. A prática, no entanto, foi diferente disso. As populações mais pobres sofreram e ainda sofrem mais com a doença e com a crise econômica decorrente dela, com taxas de desemprego nas alturas. Os baixos índices de vacinação contra a covid-19 nos países mais pobres, sobretudo no continente africano, são prova irrefutável disso.

No entanto, a experiência da humanidade com catástrofes e guerras mostra que, após essas ocorrências, comportamentos se alteram e costuma haver um aumento no comportamento solidário. Nessa linha, a área da saúde, no Distrito Federal é pródiga em bons exemplos, que se amplificaram no decorrer da pandemia, como os vizinhos que se propuseram, no período de isolamento mais intenso, a fazer compras para que os idosos evitassem se expor, indo a padarias e supermercados.

O desprendimento e a dedicação de diversos indivíduos e grupos é histórico na saúde pública do DF. Isso vem desde a organização dos usuários de postos de saúde para suprir demandas pontuais de materiais que o Estado falha em prover e chega até o super trabalho que a Abrace (Associação Brasileira de Assistência às Famílias de Crianças Portadoras de Câncer e Hemopatias) fez na construção do Hospital da Criança de Brasília.

Outros tantos grupos têm papel fundamental em preencher os vazios existentes nos sistemas de proteção social, como a Rede Feminina de Combate ao Câncer de Brasília; a Associação de Mães, Pais, Amigos e Reabilitadores de Excepcionais; a Associação Maria Vitoria de Doenças Raras e Crônicas; a Associação dos Ostomizados do Distrito Federal, os Doutores da Esperança. Me limito a citar estes, mas o mérito justificaria listar os nomes de todas as instituições e de cada um de seus integrantes que se doam pelo bem do próximo.

Se, de fato, mulheres e homens constroem o tempo, que sejam esses exemplos a inspiração para tecer o novo ciclo de 365 dias que se avizinha e para um futuro mais próspero, fraterno, inclusivo, com saúde e maior bem-estar para todos.

Exemplo que deve ser seguido também por gestores públicos, governantes e representantes eleitos para os cargos legislativos no desempenho de suas funções. Pois a boa vontade e a atuação das instituições filantrópicas e pessoas generosas e com noção bem desenvolvida de comunidade não exime o Estado de prover necessidades básicas da população, como assistência à saúde, transporte público, educação, segurança pública e segurança alimentar. Para avançarmos como sociedade, é indispensável um comprometimento claro e ações adequadas e efetivas de todos os atores sociais.

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